Nestes vinte e cinco anos de sala de aula no ensino superior, rompendo barreiras, vencendo medos e compartilhando vivências e experiências, hoje me deparo com novos significados e um novo modo de encarar a educação híbrida. Não que esse conceito seja uma novidade, mas recheado de novos significados.
A começar pelo que representará a nova Base Nacional Curricular Comum (BNCC) nesse processo de reconfiguração do modelo híbrido de aprendizagem no ensino superior brasileiro.
“Na BNCC, competência é definida como a mobilização de conhecimentos (conceitos e procedimentos), habilidades (práticas, cognitivas e socioemocionais), atitudes e valores para resolver demandas complexas da vida cotidiana, do pleno exercício da cidadania e do mundo do trabalho.
2ª Competência Geral
Exercitar a curiosidade intelectual e recorrer à abordagem própria das ciências, incluindo a investigação, a reflexão, a análise crítica, a imaginação e a criatividade, para investigar causas, elaborar e testar hipóteses, formular e resolver problemas e criar soluções (inclusive tecnológicas) com base nos conhecimentos das diferentes áreas.
4ª Competência Geral
Utilizar diferentes linguagens – verbal (oral ou visual-motora, como Libras, e escrita), corporal, visual, sonora e digital –, bem como conhecimentos das linguagens artística, matemática e científica, para se expressar e partilhar informações, experiências, ideias e sentimentos em diferentes contextos e produzir sentidos que levem ao entendimento mútuo.
5ª competência Geral
Compreender, utilizar e criar tecnologias digitais de informação e comunicação de forma crítica, significativa, reflexiva e ética nas diversas práticas sociais (incluindo as escolares) para se comunicar, acessar e disseminar informações, produzir conhecimentos, resolver problemas e exercer protagonismo e autoria na vida pessoal e coletiva.”
Já em 2018 terá início a utilização dessa nova base curricular no ensino médio, tornando realidade a inserção do aprender além das quatro paredes da sala de aula tradicional. Nessa proposta, apesar do intenso debate sobre as mudanças embutidas, o design educacional híbrido será obrigatório considerando o uso de espaços, tecnologias, formas e estratégias de conceber a educação além do universo tradicional.
Isso pode significar a chegada de estudantes no ensino superior com um olhar diferenciado para o aprender no mundo digital… Pode significar, em 2020, um novo perfil de estudantes no ensino superior egresso da educação básica (Educação Infantil, Ensino Fundamental e Médio) acostumado ao acesso às novas formas e princípios do aprender para o trabalho e a vida. Do aprender adaptativo, compartilhado e híbrido.
Convém, aqui, um pit stop para o conceito tradicional de híbrido na educação: modelo pelo qual parte da aprendizagem é presencial e parte mediada tecnologicamente, sendo nessa última sem a obrigatoriedade da presença física do professor ou do estudante. Com o avanço desenfreado das novas tecnologias de informação e comunicação, esse conceito vem sofrendo mudanças significativas tendo em vista os inúmeros espaços e formatos da aprendizagem no cotidiano da ação docente, misturando virtual com real, presencial com a distância, presencial com a curadoria da aprendizagem digital, curadoria digital com atividades em laboratórios virtuais, hiperlinks inseridos em textos digitais e em e-books; presencial com espaços de aprendizagem em nuvens, mix de repositórios de material didático fora do humano etc.
O professor será parte integrante desse hibridismo educacional, porém sem o ensinar ou o repetir conteúdo, mas como formador da aprendizagem ativo-significativa em modelos híbridos de aprendizagem, dividindo esses novos espaços com o estudante, incentivando a divisão de responsabilidade no itinerário formativo para o trabalho e a vida. O reflexo desse cenário, dessa urgência é compreensível e, de certo modo, visível na formação de professores para a docência superior.
São vários os motivos que têm incomodado professores, estudantes, autores e gestores de IES em função da relevância em compreender, apropriar, ser parte e intervir nesse futuro próximo da educação no país:
1. do ponto de vista docente, fugir a essa nova realidade é ficar de fora, sem perspectiva profissional e sem diálogo com a nova geração de estudantes (dos que cresceram na era digital e da geração nativo digital, que nasceu com ela);
2. a revisão curricular passa a ser imediata, não tendo mais espaço para o “achismo acadêmico ou conservadorismo acadêmico”, de modo a se preparar para receber esses novos estudantes;
3. embora os novos instrumentos regulatórios da EaD (decretos e portarias de 2017) favoreçam às várias formas de implementação de modelos híbridos no ensino superior, recomenda-se, como prioridade, fazer uma análise de conformidades entre as mudanças trazidas pela nova BNCC e o novo conceito de modelo híbrido na educação superior, derivado do avanço tecnológico em vários formatos, mídias e meios de acesso e armazenamento;
4. é preciso rever, na maioria das IES brasileiras, o conceito de processo educativo, de modo que o professor seja qualificado para “educar e formar” como prevê a nova BNCC e abandone o velho modelo de “ensinar e diplomar” a que estamos acostumados;
5. parece inevitável que as IES estabeleçam uma conexão direta entre seus espaços de aprendizagem, suas infraestruturas tecnológicas e as novas realidades dos estudantes que migrarão ou receberão formação baseada na nova BNCC.
Parece óbvia a mensagem embutida neste texto, mas, se considerarmos a lentidão do processo burocrático instalado na maioria das IES brasileiras, ela pode significar uma alerta para aqueles menos avisados ou com excesso de ou da pseudo confiança nos seus mais de 30 ou 50 anos de oferta tradicional no ensino superior brasileiro.
Desconsiderar as mudanças da nova BNCC e seus impactos no ensino superior é afrontar o inevitável e candidatar-se à frustração no processo de captação de novos candidatos em processo seletivo.
Enfim, o hibridismo na Educação é uma nova convocação que nos dará a oportunidade de aprender a nadar e surfar nesse novo tsunami, sob pena de afogamento inevitável…