Enilton Rocha, 13 de nov. 2024
Há quem diga que essa iniciativa seja o início de uma reviravolta, uma revolução no modelo tradicional, excessivamente acadêmico, de oferta de mestrado e doutorado no Brasil.
Analisando a proposta para o novo modelo apresentado pelo consórcio de universidades públicas em SP, observa-se que, embora as mudanças sejam poucas, elas são significativas do ponto de vista do reconhecimento da necessidade de a pós-graduação atender aos anseios e expectativas da sociedade, permitindo a formação de “mestres e doutores como profissionais altamente qualificados e competentes, com capacidade de desenvolver a ciência para além da academia”, explica o pró-reitor de Pós-Graduação da USP, Rodrigo Calado.
Nessa perspectiva, a proposta recomenda um novo modelo de programas que dialoguem com os “extramuros da universidade”, permitindo ao estudante a oportunidade de mergulhar e desenvolver estudos integrados às realidades da sua linha de pesquisa, para que o resultado de seu projeto possa impactar no desenvolvimento do país.
Para o reitor da USP, Carlos Gilberto Carlotti Junior, “Nosso modelo de pós-graduação foi criado em 1965, com o chamado Parecer Sucupira. Nesses 60 anos de vigência, o mundo mudou, o sistema de ensino superior mudou, e algumas adaptações tornaram-se necessárias. Uma delas é o tempo da pós-graduação. Atualmente, o tempo médio para titulação no Brasil é de 9,5 anos, pois há um hiato entre o mestrado e o doutorado”. Há duras críticas à inércia acadêmica durante esses mais de 60 anos do modelo vigente.
Nesse sentido, o presidente da Fapesp, Marco Antonio Zago, reforça que “esse é um problema que foi surgindo progressivamente, nos últimos tempos. Eu me formei na pós-graduação com 28 anos. Hoje, em média, o doutoramento ocorre aos 38 anos, e esse aumento de tempo não resultou em aumento de qualidade. O país não suporta isso. Essa é uma realidade que temos que mudar, simplificando os processos, reduzindo a burocracia e as exigências desnecessárias para a formação de bons pesquisadores”.
Além da burocracia retardar a inserção de egressos no mercado de trabalho, estudos mais recentes, especialmente o elaborado pelo CGEE, que apresenta um mapa do desempenho de doutores no Brasil, demonstram que mais de 80% dos egressos estão trabalhando no setor acadêmico, especialmente nas salas de aula. Esse dado talvez possa justificar a ausência de formação “extramuros da academia” nos cursos de pós-graduação, prejudicando o desenvolvimento social e econômico do Brasil. Reforça-se, assim, a indagação da sociedade: a pesquisa a serviço da academia brasileira?
Em setembro de 2022, o GT Internacional Mestrado e Doutorado EaD, em parceria com a ABED, realizou uma pesquisa exploratória, buscando evidências para esse distanciamento entre a pós-graduação stricto sensu e a sociedade. Após oito meses de trabalho, pesquisa e análises comparativas com modelos internacionais sobre a oferta de mestrado e doutorado EaD, elaboramos um relatório técnico que foi entregue pessoalmente à presidente da CAPES, no segundo semestre de 2023.
Nele, há algumas sugestões que convergem com essa proposta para o Novo Modelo de Pós-graduação implantado nas universidades públicas de SP, conforme a seguir.
Dimensões do Processo de Avaliação
Página 8 do relatório: MODELO INOVADOR
- Liberdade para o estudante escolher o seu orientador a partir de uma entrevista inicial no processo de inscrição, que poderá ser realizada, opcionalmente, de modo presencial ou online. Essa oportunidade assegura liberdade na identificação de perfis e portfólios entre orientandos e orientadores, além da liberdade de escolher, por afinidade, a linha de pesquisa e seu desdobramento durante o curso.
- Página 8 – Autonomia institucional para definir a exclusão, no processo seletivo, da obrigatoriedade de entrega do projeto de pesquisa, justificativa e expectativas, transferindo esse momento para a etapa denominada de qualificação do estudante.
- Que o mestrado não seja pré-requisito para a seleção de doutorado profissional e que, na seleção de doutorado acadêmico, essa condição seja opcional, a critério da IES.
Enfim, parece que estamos diante de uma nova perspectiva para aproximar a pós-graduação dos anseios e demandas da sociedade brasileira, iniciando um processo de desburocratização na formação de mestres e doutores. Seria mais urgente que essa iniciativa partisse da CAPES, mas a história mostra as barreiras e resistências acumuladas naquela instituição para transformar esse modelo desatualizado e antagônico de pós-graduação no Brasil. Parabéns à USP e seus consorciados por esse projeto tão importante e urgente para os brasileiros.
Acesso ao relatório técnico: Mestrado e Doutorado EaD:https://www.abed.org.br/arquivos/relatorio_GT_MD_EAD_WR3_final.pdf
Acesso ao lançamento do NOVO MODELO DE PÓS-GRADUAÇÃO: [https://jornal.usp.br/institucional/universidades-publicas-paulistas-implantam-novo-modelo-na-pos-graduacao/](https://jornal.usp.br/institucional/universidades-publicas-paulistas-implantam-novo-modelo-na-pos-graduacao/)